Minha foto
Nome:
Local: São Paulo, SP

terça-feira, novembro 04, 2008

Sobre heroísmo, pena e gratidão

No zoológico de Brasília, há coisa de 30 anos, um menino de 13 anos escalou o alambrado e caiu no fosso das ariranhas. Os bichos - eram seis - viram no menino uma ameaça aos filhotes e começaram a atacá-lo. Um sargento do Exército pulou para dentro do fosso, tirou o menino de lá, e foi tão machucado pelas ariranhas até ser resgatado que morreu de septicemia três dias depois, no Hospital das Forças Armadas, com mais de 100 mordidas espalhadas pelo corpo.

Em homenagem a ele, o zoológio de Brasília tem seu nome: Silvio Delmar Hollenbach.

Há algum tempo atrás, entrevistaram o filho deste sargento, e ele disse que a maior mágoa dele e da mãe era que nunca a família do menino salvo pelo seu pai os procurou para dizer obrigado. E o já rapaz dizia: eles acharam que a gente ia pedir alguma coisa pra eles? meu pai morreu pra salvar o filho deles e eles nem ligaram.

Tem resposta pra isso? Pode haver consolo para a dor da ingratidão? Pode-se até dizer que a família do garoto salvo estivesse constrangida com o ocorrido e sem saber o que fazer, mas nenhum constrangimento, ou qualquer tipo de sentimento, podia ser maior que o fato de que aquele garoto tinha perdido o pai.

Nem sei porque me lembrei dessa história hoje. Talvez porque o mundo ande tão individualista, com tanta gente tão egocentrada e sem tempo de olhar para outro local a não ser o próprio umbigo, que lembrar disso faz com que eu não me esqueça de que nunca devemos deixar de ter consideração ou mesmo pena pelos outros.

Aliás, o sentimento pena anda tão deturpado, e todo mundo quer tanto ser fodão, que não se pode mais sentir pena de alguém, como se isso fosse um crime. E como se receber a pena e a compaixão de outrem fosse uma ofensa. Pena sempre foi um sentimento ligado a outros sentimentos nobres. É a pena que muitas vezes nos faz estender a mão para alguém, e este gesto de compaixão, seja ele simbólico ou concreto, pode mudar a vida, tanto a de quem sente pena quanto de quem a recebe. Tenho certeza de que minhas amigas próximas sentiram muita pena de mim, por tanto sofrimento quando me separei, e por conta disso me apoiaram, não me deixaram sozinha e se desdobraram para arrancar de mim um sorriso que fosse. Não tenho dúvidas de que a pena delas me salvou.

Meus pais morrem de pena de uma senhora que passou a vida toda fazendo faxina na casa de conhecidos deles, sem ter tido carteira assinada. Para ela, ela jamais teria direito à aposentadoria. Graças a essa pena sentida, meu pai foi atrás, se informou, levantou a documentação necessária, pagou alguma taxa que precisasse ser paga, e no fim do ano, quando ela completar 65 anos, vai se aposentar e ter uma pensãozinha que a permitirá ao menos não morrer de fome na velhice.

Qualquer sentimento que te leva a olhar para o lado e te faz empreender tempo e energia com outra pessoa, sem nenhum ganho com isso a não ser o fato de saber que ajudou alguém, não pode ser menosprezado.

No dia em que as pessoas pararem de ter pena uma das outras, aí sim, neste dia, a humanidade não terá mais salvação.

8 Comentários:

Anonymous Anônimo disse...

Acho que o sentimento não é bem pena, mas colocar-se no lugar do outro, sentir o que o outro sente. Algo como empatia.
Bjs. Rosana.

7:44 AM  
Blogger Cláudia disse...

Pode ser. Eu chamo de pena, porque acho que é um sentimento ainda mais forte que a empatia.
bj

8:13 AM  
Blogger mc disse...

Engracado que desde que me conheco por gente as pessoas falam que "e feio" sentir pena dos outros.

Pena nao e desprezo, e eu concordo com voce.

10:10 AM  
Anonymous Anônimo disse...

É...eu acho também que é como empatia, compaixão...

Mas sabe o que me angustia também? sabendo que Deus é justo e coisa e tal, certas pessoas que não tem 'pena' de outras porque estas outras sofrem... alegando que Deus é justo e que o sofrimento é necessário.
Quanta frieza.................
beijos,
Vi

11:49 AM  
Blogger Ana disse...

clap clap clap

As vezes eu mesma me policio pq tenho pena de alguem, e todos dizem por ai que é um sentimento errado... bom ver que não sou só eu que penso assim.

9:34 PM  
Blogger Renatinha disse...

LIndo texto Clau...
É isso aí... Vamos olhar para algo além do nosso umbigo, vale apena.
beijos
Re

11:53 AM  
Blogger Dedinhos Nervosos disse...

Lindo texto mesmo. Quando estive em Brasília em 2003, meu amigo que me apresentava o Zôo me contou essa história e eu fiquei emocionada com a bravura do cara. E agora me emocionei mto com seu texto. Aqui em casa aprendi desde cedo a olhar pelos outros, a dar valor, a fazer com que a pena seja a alavanca para ajudar de verdade alguém. E não apenas ficar no sentimento. Adorei. Bjos.

1:06 AM  
Blogger Nana disse...

Eu me lembro dessa história!
Beijo,
Nana

6:56 PM  

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial