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sexta-feira, março 26, 2010

Memória afetiva

Já contei aqui que quando escuto Just My Imagination, do Lillo Thomas, eu me vejo na Estrada de Jacarepaguá, num belíssimo fim de tarde de verão daqueles que o Rio de Janeiro é especialista em nos proporcionar, em alguma das minhas férias de adolescência, nas quais a grande preocupação da vida era se ia chover ou fazer sol no dia seguinte, que a maior questão a ser decidida era qual biquini usar na praia, caso fizesse sol, e que problemão pra valer era se o ventilador não funcionasse na hora de dormir.

Não contei que até hoje me sinto mal ao passar em frente ao flat para onde meu ex-marido foi na ocasião da nossa separação, pela mera lembrança do sofrimento da época. E não sei se mencionei que quando escuto a música disco Dance a little bit closer, cantada por uma perua loura ensandecida chamada Charo, na mesma hora eu me lembro que minha mãe dizia que ela adorava esta música. Acho que nem mesmo ela se lembra de que a música existe, mas eu me lembro até do vestido de lurex que a precursora da Pamela Andrews usava.

É a memória afetiva, poderosíssima!

Como o Destino rege nossas vidas mesmo que a gente faça uma força danada para lutar contra ele algumas vezes - já contei aqui a piadinha da morte? não? conto no final do post para não matar os curiosos de ansiedade - eis que recentemente minha memória afetiva tem aflorado e me transportado para a primeira e mais querida quadra de Brasília onde morei, a 103 Norte.

Lá eu tinha uma amizade estreitissima com um menino que era a sensação da quadra, de tão bonito. Aliás, eles eram em 4 irmãos, carinhosamente apelidados de Família Maravilha e por aí vocês podem imaginar o frisson (ai, tô velha!) que eles causavam na mulherada (todas na faixa de 14 a 19 anos, eu me inseria na dos 14, a pirralhada). Já mencionei aqui também que um deles, o terceiro na linha de sucessão, era maratonista, todo atleta, estudava no colégio militar e era um espetáculo à parte vê-lo chegar do colégio com aquela farda marcando o bumbum e as coxas atléticas. Uma amiga minha dava o braço direito por um sorriso dele.

O mais velho de todos era tão mais velho que a gente, assim logo uns 7 ou 8 anos a mais que eu, praticamente um senhor, que não consigo me lembrar exatamente das feições dele. Porém, eu suspirava e chorava mesmo era pelo segundo na linha de sucessão. Alto, charmoso, misterioso, sério, sorriso lindo, uns 6 anos mais velho que eu, acho, totalmente Jesus Me Chicoteia!. Já estava na faculdade, já dirigia, já era um homem, e eu apenas uma menina.

Aí sabe como é paixão antiga, né? Sempre mexe com a gente, é tão dificil esquecer, basta um encontro por acaso e pronto, começa tudo outra vez, já dizia o grande filósofo Tim Maia. Mesmo as platônicas, porque é claro que ele nem sonhava que eu sentia tudo isso, e só faltava mesmo dar uns tapinhas na minha cabeça quando me encontrava conversando com o irmão caçula. Eu me sentia tão pirralha, tão insignificante, tão murcha, e ao mesmo tempo vê-lo era uma alegria tão grande vê-lo que eu estava quase igual ao meu cachorro, que bastava o carro do meu pai entrar na quadra que ele já sabia que era ele, e eu estava já quase adivinhando que era ele quem chegava pelo barulho do Chevette que ele tinha - e quem não tem noção do que é um Chevette ou nunca viu um novo, ao vivo, faz favor de parar de ler este post e ir brincar com a sua turma!

O Destino começou a entrar nessa história muitos anos depois, mais precisamente há oito anos, quando uma amiga precisava entrevistar um cara forte da IBM. Morando ela fora do país, e nós ambas jornalistas, ela me pediu se eu poderia ajudá-la e fazer por ela a parte da entrevista que ela não conseguisse fazer online. Concordei. Ela me mandou os dados do entrevistado e a foto dele.

Meu coração disparou. O moço que eu tinha de entrevistar era justamente ELE, o meu JMC! da adolescência. Que eu não via, nem tinha noticias, nem nada disso, há uns 15 anos fácil. A partir daí fiquei sabendo que ele sempre morou quase no mesmo bairro que eu, que por muito pouco nossos filhos não estudaram no mesmo colégio, que provavelmente frequentamos o mesmo shopping só que nunca, nunca nos esbarramos.

A entrevista acabou não acontecendo, a vida mudou de novo, e eu passei a não saber mais dele e a coisa ficou de novo no fundo das minhas lembranças. Não sei dizer como, nem porquê, acho que caiu no meu colo a informação, como acontece com tudo o que o Destino quer que saibamos sabe-se lá o motivo, que ele estava em uma outra empresa, no mesmo prédio em que uma grande amiga trabalha.

E agora, eu, que em anos nunca encontrei o moço, um belo dia vou almoçar com esta minha amiga no local onde fica a empresa onde ela trabalha - um complexo de escritórios, hotel, lojas e restaurantes - e quem eu vejo nos corredores??? De longe?

Ele.

Me senti com 14 anos de idade, de shortinho jeans, na quadra onde eu morava, nutrindo uma paixão platônica por alguém que nem notava minha existência. Eu estava almoçando, ele apenas passando, provavelmente indo almoçar em algum outro restaurante do local. Não comi mais, perdi a fome, e fiquei ali, colada na minha cadeira, sem saber o que fazer, os olhos brilhantes, o rosto ardendo, o coração a mil.

Depois disso, outras vezes fui almoçar com esta amiga e outras vezes o vi. Não tive coragem de cumprimentar, porque temo que ele não se lembre de mim. Ou temo que ele se lembre e diga ah! é aquela pirralha que me idolatrava. Na verdade, temo minha própria reação, temo gaguejar, temo tremer os lábios quando falar com ele, temo não conseguir disfarçar a minha euforia e parecer uma tonta idiota saltitante.

Ou talvez eu tema apenas descobrir que eu cresci, que ele nem é isso tudo que eu sempre imaginei, e que vá embora uma das lembranças mais doces e inocentes que eu tenho comigo.

10 Comentários:

Blogger Pri S. disse...

Que texto lindo e gostoso de ler! Poxa, fiquei na expectativa a partir de um certo momento, achando que vc iria encontrá-lo depois de tanto tempo! rsrsrsrs

Lembrar dessas coisas de adolescente é o máximo. São essas vivências q nos tornaram quem hoje somos.

E entendo qdo vc diz q talvez não queira perder sua doce lembrança... Algumas coisas devem permanecer mágicas.

Ou não... rsrsrsrs Bjo!

12:06 PM  
Blogger UrbAnna disse...

Clau,
Entendo perfeitamente e já me vi em situação pareceida até mais de uma vez.
Agora, fala sério se não é uma delícia essas sensações que vc teve??? A emoção de ver, a vontade de falar com ele, mas ao mesmo tempo um medo... não sei explicar em palavras, mas são coisas que sentíamos com muita frequencia quando adolescentes e que agora, nas raras vezes que sinto isso novamente, faz-me sentir viva por dentro!
Adorei a história, mas apesar de ficar ansiosa tb por um desfecho, acho muito interessante que a coisa fique assim com essa eterna e doce lembrança.
beijo

1:08 PM  
Blogger Cláudia disse...

Pri e Anna, este é um post da vida real, e não de novela!! Se fosse da novela das oito, eu terminaria o texto dizendo que vamos nos casar, ter três filhos lindos e um cachorro.
Pensando bem, podia né? rs
Independente de qualquer outra coisa, sim, é uma delícia e esses momentos dão um colorido todo especial à vida.

beijo

2:59 PM  
Anonymous Rosana disse...

Pelo motivo do último parágrafo, nunca,mas nunca mesmo, assista "Os embalos de sabado à noite" (que título, migod)de novo.
Bj Rosana

4:16 PM  
Blogger Cláudia disse...

Nem Guerra nas Estrelas!
bj

1:08 PM  
Blogger Dedinhos Nervosos disse...

Que post delicioso! Lembrei tb de vários caras quem e faziam suspirar, mas essa paixão (platônica) toda, eu nunca tive.

E olha... se eu estivesse nesta situação, já teria mandado 1 bilhetinho pelo garçom fácil... do jeito q vc é boa de texto, pode fazer um textinho simpático. Seria bem inesperado, mas era capaz dele lembrar de vc.

Beijos!

4:24 PM  
Blogger Cláudia disse...

Anna
tu é um gênio!
beijo

2:29 AM  
Blogger Unknown disse...

Falar que eu adorei o texto é redundância, mas a verdade é que esse texto tb me reporta às minhas memórias afetivas, só que, infelizmente, como vc bem se lembra, a minha paixão platônica não era um cara tão lindo qto o seu, né??? Na minha situação, é caso de esquecer, e não de ficar lembrando, aquele meu período "eu adoro homem feio" da vida...rs...rs...rs... mas que delícia lembrar desses momentos, bolar, ainda que na nossa mente, finais diferentes...no meu caso,por exemplo, ele fazia cirurgia plástica, tirava aquele bigode horroroso e, claro, se apaixonava por mim....rs...rs... bjo

12:29 PM  
Blogger Cláudia disse...

Eu vivo nesse periodo adoro homem feio, segundo isabela... rs
beijo

10:31 PM  
Blogger Cintia D Camargo disse...

Clau, amei o post...
Mas e aí? Ele continua JMC??? uhauhuahuha Beijo!

10:57 AM  

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