Quando eu me separei, eu não sabia lidar com a solidão. Pra começar, eu morria de medo de cair em depressão, adoecer, essas coisas, então eu tinha pavor de dar chance de alguma forma para isso acontecer.
Assim, depois que minha filha dormia - na época ela ia pra cama no máximo às nove - eu me enfiava na academia, até às 11h da noite, quando fechava, por dois motivos: o primeiro era que, com Bela dormindo, a casa ficava vazia e silenciosa demais e ninguém ia chegar; o segundo é que eu precisava da exaustão para adormecer e permanecer dormindo algumas horas por noite, o suficiente para me manter de pé no dia seguinte, sem ter a menor noção do que ia fazer da vida dali pra frente.
O problema era nos finais de semana. Em alguns, ela ia dormir na casa do pai e eu me via perdida e sozinha em uma casa que me parecia grande demais. Para piorar a situação, a academia fechava cedo no sábado e nem abria no domingo - somente a unidade do Butantã. Eu felizmente tinha meus amigos para me amparar, me animar e me apoiar, mas não era todo dia que eu tinha ânimo ou vontade de sair, ou de falar com alguém. Em outros dias, eu tinha pena deles, porque eu achava mesmo que eles precisavam de um descanso da minha tristeza e eu não tinha nada mais a oferecer do que lágrimas e encher os ouvidos deles.
Mas aí o que eu ia fazer? Sair sozinha por aí não era opção, ficar em casa muitissimo menos. Acho admirável a mulher que se senta tranquilamente em um restaurante ou um bar e curte a própria companhia. Homem faz isso com um pé nas costas, mas mulher é mais dificil. Além do mais, com 2 horas diárias de treino pesado na academia combinadas com um iogurte e um sanduiche de peito de peru diários, porque isso era o que parava no meu estômago e mais nada, eu estava praticamente a morena do tchãn e ser assediada era a última coisa que eu queria no mundo - as coisas acontecem na vida da gente na hora errada não?
Assim, a única solução para o meu problema era ir ao cinema. Sozinha. Nem sei quantos filmes eu vi nessa época, completamente sozinha, sem nem mesmo um saco de pipocas como escudo protetor - porque não comia nada - com o principal pensamento de que pelo menos eu passaria duas horas e meia distraída com alguma coisa e isso ajudaria a queimar o tempo que faltava para poder me enfiar no meu quarto de novo sem que isso configurasse, para mim mesma, que eu estava caminhando para a depressão.
Era esquisito, porque desde os 15 anos eu sempre havia estado com a mesma pessoa, fazendo tudo junto, partilhando tudo, e de repente eu estava ali, vendo um filme, sem ninguém conhecido para eu comentar as cenas, para dividir a pipoca e o refrigerante, para rir das coisas engraçadas e para perguntar que parte eu perdi quando não prestava atenção direito.
Passada essa fase braba, ficou registrado na minha Memória Afetiva que ir ao cinema sozinha era muito, muito solitário. E nunca mais fui. Ajudou o fato de que sempre tem alguém pra ir junto comigo, mas mesmo quando era um filme que eu queria ver e ninguém mais o queria, eu não ia sozinha.
Até hoje.
Tudo isso aí em cima pra contar que saí do trabalho às 18h15, bem no horário em que o trânsito para atravessar a ponte está um horror e levo uma hora para percorrer pouco mais de 5km. Bela não ia dormir em casa, então não havia a motivação de encontrá-la para me fazer enfrentar o mar de carros. Academia também não era opção, porque a sacola não estava no carro e eu já tinha me proposto a não ir hoje, porque ontem eu tinha malhado demais - detesto esse verbo, malhar, mas achei que
me exercitar era muito formal e não achei outro.
Resolvi então... ir ao cinema!!!! Mas é claro que nesse horário tão cedo - porque meu dia começa cedo, mas acaba cedo também - todo mundo que conheço ainda nem sonha em sair do trabalho, então não havia uma única alma disponível para convidar.
Cheguei ao shopping, comprei minha entrada, pipoca com manteiga, coca-cola zero com bastante gelo, e me enfiei na sala 2 para assistir a
Homem de Ferro 2, já que eu adorei o 1.
Amei! O filme, porque adoro esses filmes tipo Ironman, Transformers etc, vai entender. Nem sou assim uma pessoa rock'n'roll, o mais perto que chego de ser roqueira é gostar de Bon Jovi e Aerosmith, mas até passei na Livraria Cultura depois pra ver se achava a trilha do filme pra comprar - não tinha...
Amei! Descobrir que ir ao cinema sozinha deixou de ter o peso que tinha, e eu nem sabia, por puro medo. E passou a ser uma ótima opção para fugir do trânsito pesado, relaxar depois de um dia cheio de problemas, limpar a mente, me divertir.
Agora já posso até ver os filmes com roteiros mal escolhidos estrelados pelo Nicolas Cage e que ninguém tem coragem de me fazer companhia!